Impostos da bicicleta diminuirão com a Reforma Tributária, explica Rodrigo Orair, do Ministério da Fazenda

Juntamente com George Queiroz (Canal BicicleteirosBr e Pedalula) entrevistei o diretor da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Rodrigo Orair, que trabalha diretamente com o secretário, Bernard Appy, na equipe do ministro Fernando Haddad.

Ele nos cedeu o tempo para explicar a situação da bicicleta na Reforma Tributária. “A oficina de bicicleta no Simples vai continuar do jeito que é hoje, sem aumento de alíquota”. Garantiu.

A entrevista foi muito didática, inclusive para quem não tem nada a ver com o setor de bicicletas, não entende de tributos, mas quer estar atualizada sobre essa iniciativa do Governo Lula de modernizar o sistema de impostos do Brasil, para ficar alinhado às melhores práticas internacionais.

Em geral, aquilo que é atualmente cobrado de Imposto de Produtos Industrializados (IPI), PIS/Cofins (impostos sociais), ICMS (imposto estadual) e ISS (municipal) será transformado no Imposto de Valor Adicionado (IVA), composto por dois impostos: o CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). Isso vai dar transparência para a destinação da arrecadação, que hoje é uma “bagunça”.

Ele afirma que aquilo que você vir na Nota Fiscal após a conclusão da reforma, que começa a ser implantada paulatinamente a partir de 2027, depois de um ano de testes, será aquilo mesmo. Tal como já é no Simples Nacional. Hoje, todavia, os valores apresentados nas notas fiscais são “fictícios”. Falou ainda que é possível, após a reforma, instituir mecanismos para incentivar o uso da bicicleta a partir de políticas públicas, usando por exemplo o cashback, que devolveria o imposto pago para o consumidor final.

Ele disse ainda que essa uniformização de impostos pode trazer a carga de tributos da bicicleta para algo em torno de 25%., ou seja, vai baratear as bicicletas.

Ressaltou ainda que “nunca” a bicicleta esteve na iminência de ser sobretaxada por figurar inicialmente no Imposto Seletivo, por ser um dos itens fabricados na Zona Franca de Manaus, o que permite um benefício fiscal para as indústrias desse polo, que precisa ser contemplado de alguma forma. “Não existe qualquer possibilidade de aumentar a carga tributária em função desta reforma“.

Ele explica como fica na entrevista essa questão, que você pode ler abaixo ou assistir no YouTube

Rogério Viduedo – Como que vai ficar a bicicleta na Reforma Tributária? A Aliança Bike fez uma campanha dizendo que a bicicleta seria sobretaxada no “imposto do pecado” porque na PEC (Proposta de Emenda Constitucional) número 45, que foi criada em 2019,  o imposto seletivo seria utilizado para dar uma distinção ao imposto que já é cobrado da bicicleta, o IPI, para distinguir do produto que é produzido fora da Zona Franca de Manaus. O texto que foi aprovado no Senado recentemente já eliminou a bicicleta e outros bens produzidos na Zona Franca de Manais do imposto seletivo mas, ainda que a bicicleta não seja mais considerada, não esteja mais sob ameaça do imposto do pecado – que para mim é uma questão de semântica -, ainda vai precisar ter uma distinção para que, como disse o presidente da Abraciclo na última coletiva de imprensa, seja garantido o direito constitucional das empresas que se instalaram lá, que têm benefícios fiscais.

Rodrigo Orair – Hoje é uma bagunça o sistema tributário brasileiro.  Você tem uma miríade de impostos; o IPI o PIS/Cofins, o ICMS, e o ISS. Boa parte deles incide sobre bicicleta e, mais do que isso, a tributação dos bens e serviços é completamente díspar (desigual). Então, os bens industriais, incluindo, a bicicleta, pagam demais e outros pagam muito menos. O que a reforma faz? Essa, em particular. O objetivo dela não é aumentar carga tributária, é uniformizar, simplificar, padronizar. Coisas que pagam hoje, demais, como a bicicleta, vão convergir para outros (bens) que pagam muito pouquinho, também.

Vão convergir para essa média, de maneira que a carga tributária vai ficar absolutamente igual. Na verdade, existe até a possibilidade da carga tributária sobre bens e serviços se reduzir caso haja avanço de uma reforma de Imposto de Renda. Está lá previsto na PEC, mas isso é um outro debate.

Você vai trocar o IPI, o ICMS e o Pis/COFINS, que hoje incidem nas bicicletas, por um tributo muito mais moderno, (Imposto de Valor Adicionado – IVA) sem cumulatividade, com melhores práticas internacionais que, pela característica do federalismo brasileiro, ele é dual. Ele vai ter uma contribuição federal e um imposto que vai para os governos subnacionais.

Possivelmente, ele vai convergir aí para em torno de 25% que, é inclusive, menor do que é hoje. Se você for somar IPI mais PIS/Cofins e mais o ICMS que incidem sobre bicicleta na grande maioria das regiões do Brasil.

É isso que a reforma faz; ela simplifica, deixa transparente e acaba com a cumulatividade. O que era o enrosco do seletivo? A gente quer criar um sistema que é moderno. Hoje, os sistemas modernos têm dois pilares: esse imposto sobre valor adicionado transparente, que hoje também tem uma grande confusão, que tem muita tributação na cadeia, desde o início, das peças de bicicleta, passando pela empresa de bicicleta, é muito imposto que tá sendo pago, não na venda pro consumidor final e ele se torna um imposto não-cumulativo. E o imposto no consumidor final, ele de fato é o que está valendo, vai ser muito mais transparente.

O segundo pilar é um imposto que tem crescido muito ao redor do mundo, é o Imposto Seletivo, cujo grande objetivo é coibir com comportamentos danosos à saúde e ao meio ambiente. Então, está se instituindo esse imposto. Nunca foi objetivo incidir esse imposto sobre bicicleta tá? Isso é o tipo de informação que está desde o início tá errada. Agora, o que é a peculiaridade no Brasil? A gente vai eliminar a grande maioria dos benefícios fiscais que existem hoje, incentivos tributários que beneficiam os mais ricos.

Vão continuar alguns que são meritórios. Primeiro: o Simples. A oficina de bicicleta no Simples vai continuar do jeito que é hoje, sem aumento de alíquota. A pequena empresa que vende bicicleta, também continua como é hoje, nada muda. Na verdade, pode até melhorar! Outra que também vai continuar é a Zona Franca de Manaus. Ela continuará existindo no novo modelo. É uma região extremamente importante, são 100 mil empregos diretos e 400 mil indiretos.

E como que a gente migra do modelo que existe hoje de Zona Franca para outro modelo que seja melhor para a região e que seja gerador de empregos e mais sustentável do que é hoje? Essa é uma preocupação. Como que estava prevista a Zona Franca antes e como está prevista a agora? O que é que houve na mudança entre a Câmara e entre o Senado?

Hoje existe um conjunto de produtos na Zona Franca que recebem benefícios fiscais que garantem a competitividade desses produtos. Entre eles, a bicicleta. Mas não é só bicicleta. Concentrado de refrigerante; ar-condicionado, motocicletas… O que é o compromisso? Esses produtos que existem hoje, você vai criar outros instrumentos para manter a competitividade da produção específica nessa região. Então, é só coisas que já existem hoje que vão ser trazidas para outro modelo.

O principal fator hoje que dá competitividade para lá, pra região da zona franca, é o IPI. 

Mas o IPI de bicicleta não é tão grande. Porque tem (alíquotas) de IPIs que são 30, 35% e o IPI de bicicleta ele é menos de 10%. Então, no caso da bicicleta, não precisa dele, você consegue fazer outro tipo de benefício fiscal que não passe pelo IPI; você vai poder zerar tranquilamente as alíquotas de IPI de bicicletas como, não só para bicicleta, mas para várias outras coisas.

A Zona Franca continua existindo e vai ser criado outro tipo de benefício fiscal no novo modelo. Em alguns casos, não precisaria. Esse benefício fiscal pode ser feito (para produtos) dentro da próprio novo imposto que está sendo criado, o federal (a CBS – Contribuição de Bens e Serviços).

Bicicleta é um deles. Em outros, isso não era suficiente. A primeira versão (do imposto seletivo) criava a possibilidade de, caso (migração para novo imposto) não fosse suficiente, em alguns casos muito específicos, manter o IPI sobre produtos da Zona Franca e, eventualmente, o imposto seletivo. Mas isso não ia se aplicar sobre bicicleta. Só que foi até bom essa discussão de bicicleta porque causou uma revolução.

O que o Senado falou? Bom, está dando ruído? Então tudo bem. Acaba com essa história. Então, agora vai zerar IPI para tudo. Não vai ter (imposto) seletivo a não ser naquilo que seja danoso à saúde e ao meio ambiente. E quando precisar ter diferencial de competitividade para aqueles produtos cujo IPI hoje é muito alto para dar a competividade pra Zona Franca, isso vai ser feito num imposto que já existe hoje, que é a CIDE.

Então, como é que tá a situação? Não tem seletivo sobre bicicleta! Não vai ter IPI sobre bicicleta, tá? E sobre outras coisas, que não será bicicleta, pode ter uma CIDE incidindo para manter esse diferencial de competitividade da Zona Franca.

George Queiroz – Vamos dizer, o pleito da Aliança. Porque existe uma associação patronal que representa Manaus, (Abraciclo) que é do Polo de duas rodas. E a Aliança que representa, vamos dizer o restante do setor né? Eu tô simplificando mas de qualquer forma o pleito tinha, vamos dizer, a preocupação de que ao invés de dar um incentivo para a Zona Franca você faria o oposto, que é punir as restantes né? Fazer um imposto que cobraria sobre as restantes. Vamos dizer, o setor de bicicleta de fora de Manaus representa 80% da produção de bicicletas e 20% é bastante coisa numa cidade, mas houve essa preocupação de que houvesse um imposto, que é o imposto seletivo, que em tese ele é inclusive extrafiscal né? Sendo utilizado como uma punição extra, uma punição coletiva, que inverteria o processo de incentivo.

O que a gente pode dizer para esse empresário, vamos dizer, lá pro setor, pro bicicleteiro que tem uma fábrica pequena, ele pode ser punido para que Manaus, e são empresas grandes, multinacionais, manterem uma vantagem competitiva sobre um produto cujo consumo tem que ser incentivado?

Rodrigo OrairNão tem seletivo sobre bicicleta. Não vai ter IPI sobre bicicleta. Bicicleta vai estar sujeita ao IBS, aos impostos novos, ao IVA, tal qual outro bem industrializado. Inclusive vai haver uma redução (de carga)  na maioria dos bens industrializados, tal qual todos os outros serviços, exceto aqueles que tiverem tratamento favorecido.

Vai até melhorar em relação ao que é hoje. Agora o que que existe? A  possibilidade de ter uma tributação da CIDE (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) em outras coisas nos quais não seja possível manter a competitividade da Zona Franca, com créditos presumidos ou com benefícios dentro do atual IBS e CBS. Na verdade, principalmente, a CBS. Como no caso da bicicleta, o diferencial de IPI é pequeno, não é na bicicleta que vai acontecer o problema. Mas existe sim um compromisso de manter o diferencial de competitividade da Zona Franca.

Vai ter sim um benefício fiscal para produzir o que já é produzido hoje na Zona Franca, mas no atual modelo não vai ser um adicional (uma taxação) para quem está fora (de Manaus). O produtor de bicicleta lá de Governador Valadares, lá do Paraná, de São Paulo, ele não vai ter que pagar um adicional (para produzir bicicletas e peças). Isso não vai acontecer.

Rogério Viduedo – Mas vai continuar existindo um imposto como existe para qualquer meio de produção? O valor agregado, simplificado, né? Porque existem três emendas de senadores que pretendem zerar os impostos da bicicleta, que é o que a gente quer. O Bicicleteiros, o  Pedalula e o Jornal Bicicleta defendem que não houvesse nenhum tipo de imposto para produção de peças, de bicicletas inteiras, para que a gente pudesse dar um andamento no combate à crise climática e ajudasse trabalhadores e trabalhadoras a se locomoverem.

George Queiroz – Inclusive a gente pescou um discurso do (Fernando) Hadad, ele falando a que bicicleta deveria ter imposto negativo.

https://valor.globo.com/politica/noticia/2014/09/22/haddad-defende-isencao-de-impostos-para-fabricantes-de-bicicletas.ghtml

Porque na verdade o ganho de saúde pública, o ganho de sustentabilidade é muito superior, ou seja, tributar um produto sustentável como uma bicicleta, é um contrassenso, eu lembro isso, é a palavra dele né? Isso é um contrassenso, porque você ganha de outras formas, imaginando um produto que tem de ser popularizado, massificado e que tem um papel fundamental. Isso você vê no exterior, na Europa, e ele falou isso em 2017. Isso passou a ser moeda muito comum na Europa, em países desenvolvidos, essa ideia até de dar voucher, de dar mensalidades para quem usa bicicleta, ao invés de trocar o carro né? Mesmo que seja elétrico, por uma bicicleta que seja elétrica. Mas pra gente massificar  um produto, ou seja, a gente tá falando de um produto  que merece ter uma carga mínima, que seja até negativa a gente defende. O Haddad já falou disso e, ao mesmo tempo, a gente acaba entrando numa disputa que é essa questão da Zona Franca, ou seja, da competitividade, mas pela gente né, pelo que a gente entende, se a gente massifica um produto a Zona Franca vai ganhar muito mais,, e todos os demais porque a gente tá imaginando que a bicicleta merece estar num patamar muito maior, dada a emergência climática, que é uma questão muito presente aí no planejamento econômico, imagino, que na reforma também né? Que cê você imagina sobre isso?

Rodrigo Orair – Como que tá na reforma. Hoje, bicicleta, bens industriais, pagam muito mais do que 25%. Assim como tem alguns serviços consumidos principalmente pelos muito ricos que pagam menos de 25%. O que a reforma está fazendo? Reduzindo a tributação dos bens industriais e aumentando a tributação de boa parte desse serviço. E você está uniformizando quase tudo em torno de uma alíquota mais razoável, que fique bom para a grande maioria das coisas. O que que ficou de fora? O que vai ser alíquota zero? Alimento da cesta básica. O que que vai ter alíquota reduzida? Transporte público, saneamento. Mas é uma é uma lista que não é tão grande, tá? Restrita. Agora, a bicicleta não. Bicicleta vai ser tratada do mesmo jeito que uma camiseta, do mesmo jeito que uma série de bens meritórios.

Do ponto de vista ambiental, o que que é possível? Aí sim, o Imposto Seletivo. O Imposto Seletivo  pode sim incidir, assumir as feições de um Carbon Tax (taxa de carbono)  tributar formas mais danosas ao meio ambiente, então você pode encarecer mais aquelas práticas predatórias. Antigamente, nos anos 70, você pensava que tudo faria com alíquota zero, com diferenciação. Hoje você pensa o seguinte: não é o melhor instrumento, porque você começa a complicar o sistema tributário, você começa a dar espaço para lobby, você começa a dar espaço para planejamento.

Que é o recomendável hoje? Vamos tratar tudo igual em geral e aí eu subvenciono aquilo que eu quero estimular. Ao invés de eu simplesmente dar uma… e mesmo porque tem outra coisa; quando eu dou uma alíquota diferenciada, não necessariamente vai chegar no preço do produto final, às vezes fica só na margem da empresa. Nada contra o empresário, mas enfim, às vezes eu não alcanço esse objetivo final.

George Queiroz  – O empresário absorve o lucro, é isso? Ele vai, e vamos dizer, rouba a subvenção de alguma forma?

Rodrigo Orair – Bom eu não posso falar rouba não, vou dizer, ganho econômico. A ideia é a seguinte, o pass trough não é total, tá? Parte fica na margem (de lucro). Então o que é melhor? Você tem duas alternativas; uma é, por exemplo, o cashback (retornar o imposto para o consumidor). Eu digo, esses bens aqui são meritórios, e eu vou devolver pro consumidor, parte ou total. E aí eu consigo ter até um controle, dou um limite. Também não é qualquer bicicleta. Eu posso dar um limite, eu posso ter critérios para devolver esse imposto diretamente pra pessoa física, mas eu deixo o sistema tributário limpinho.

Outra maneira é eu subvencionar a atividade. Eu dou uma subvenção financeira pra empresa, que produz aqueles bens que eu acho que são meritórios. Mas qual que é a diferença dessa subvenção econômica?  É que eu consigo colocar metas no projeto. Eu falo. Olha. Tudo bem. Eu vou te dar essa subvenção, mas você tem que ter meta de emprego. Você tem meta de manter o preço baixo pro consumidor final. Você tem que ter meta de usar técnicas produtivas mais sustentáveis tá?

Então hoje, sendo muito sincero, não é recomendável diferenciar alíquota. O ideal é ter alíquota mais uniforme. Deixa o sistema tributário funcionar. Se você quer estimular um determinado bem, você pode fazer ou subvenção econômica com critérios que você consegue controlar ou então você devolver direto consumidor final e não pro intermediário na cadeia (de produção ou comércio). Eu dou devolução pro consumidor final. Pode ser (usado) para alimento, pode saúde, pode ser para educação, pode ser para energia elétrica,

e pode ser, por que não, para bicicleta, tá? Eu acho que assim: não achar que a gente vai fechar esse modelo né? Eu acho que ele é um caminho pra gente conseguir coisas melhores. Ele é bem desenhado do ponto de vista técnico e eu acho que ele cria por exemplo, ele institui o cashback de alimentos, de energia elétrica, e de de gás liquefeito, o botijão de gás.

Então existe a possibilidade de outros bens também entrarem. Eu prefiro essa alternativa do que simplesmente diferenciar alíquota.

George Queiroz – Insistindo na questão da sustentabilidade, né, que é uma eh, uma pauta totalmente presente. O Haddad fala muito, o Lula tem colocado isso como prioridade, vamos dizer, de colocar, no, centro do planejamento econômico a sustentabilidade. A bicicleta é um produto popular a princípio. Claro que existem bicicletas que são de valores absurdos mas quando a gente fala muito de sustentabilidade na área de transporte, nós somos ciclistas, a gente tem uma certa bronca, enfim é muito falado sobre a questão da descarbonização, de carros elétricos de produtos de ponta, que em tese merecem todo tipo de de auxílio. Vamos dizer que seja tributário, porque nós “estamos salvando o planeta com os carros elétricos” (contém ironia), mas são produtos de ponta que não são populares né? Um carro elétrico mais barato são 200 mil reais, 500  mil reais,  ou seja qualquer tipo de subvenção a um carro elétrico em tese é regressivo, eu dou um desconto a uma pessoa de alta renda.  que vai, em vez de pagar, ganha certa subvenção. Já as bicicletas acabam sendo meio café com leite, vamos dizer, um pouco nesse debate. Apesar de ser um produto popular que tem sido incentivado na Europa. Na Holanda e na França; não é café com leite. Mas aqui ainda é tratado como brinquedo. Como que a gente pode falar de sustentabilidade sem cair nessa armadilha?

Essa armadilha do produto de ponta, do produto de primeira, das novidades tecnológicas que são caras você subvencionar? Produtos que a gente inclusive nem sabe se vão de fato trazer esse benefício de sustentabilidade. O carro ecológico… um carro elétrico… são 500 Kg de bateria de lítio, problemas diversos. Toda essa discussão fica ali por baixo porque é sempre vendida essa panaceia de que é um produto tecnológico. Um produto novo de quinhentos mil reais. E eu tenho aqui a minha bicicletinha que eu sei que ela não vai gerar carbono. Ela é um produto necessário. Ela é uma necessidade das políticas de transporte e a gente vê muito pouco na boca das pessoas, dos planejadores, dos gestores e tal. Quando vamos falar de sustentabilidade, especialmente na área de transportes, fala-se muito de eletrificação e combustível etc.

Como que a gente pode falar disso em termo tributários, de um orçamento de Estado, trazer o produto popular para a questão da sustentabilidade?

Rodrigo Orair  – O tema é bem interessante. Vocês vão ver a quantidade, quem tiver depois curiosidade, entra no texto da PEC, e veja a quantidade de vezes que apareceu a palavra ambiente, meio ambiente, estímulo a geração, a sustentabilidade ambiental. Eu acho que eu nunca vi, posso tá errado, mas eu nunca vi entrar tantas vezes a palavra meio ambiente na Constituição como está entrando agora. Inclusive como princípio a ser observado do sistema tributário. Tenta, entra lá e faz Ctrl F, ambiente. Vocês vão ver a quantidade de vezes que vai aparecer.  Eu acho que ela pode ser uma ponta de lança de reformas mais estruturais na direção de modelo ambientalmente mais sustentável. O que que os modelos internacionais, as melhores experiências mostram? Olha o que o imposto faz o imposto seletivo. Ele quer coibir comportamentos danosos a saúde ao meio ambiente. Obviamente ele vai onerar mais aquilo que gera externalidades. Então, aquilo que faz mal pro meio ambiente, eu coloco o seletivo e faço com que ele pague mais.

Não vai ter isso na bicicleta, pelo amor de Deus gente, não acreditem, que é mentira! Mas alguma coisa que faz mal a meio ambiente, sim, vai ter que pagar um preço, maior. Isso resolve o problema? Não; porque eu tenho que pensar num sistema de políticas. Se essa oneração né do consumo ou das atividades produtivas que são danosas ao meio ambiente vai levantar recurso (dinheiro) o ideal é que esses recursos sejam canalizados por um conjunto de políticas, que passa por recuperação ambiental, adequação de infraestrutura, financiamento para política de desenvolvimento tecnológico, desenvolvimento de tecnologias alternativas e também de conscientização da população.

Então, você tem que ter, digamos, as coisas caminhando juntas. Isso eu acho que vale também para a questão de transporte. Não adianta simplesmente eu punir aquele que é danoso ao meio ambiente se eu também não tenho campanhas de conscientização, se eu também não tenho readequação de infraestrutura. Eu morei muito tempo em Brasília, que é ótimo de andar de bicicleta, e agora estou em São Paulo, que é difícil, ser ciclista em São Paulo tem que ser raçudo, porque não é fácil né, não é não,

Rogério Viduedo – É hostil!

Rodrigo Orair  –  É hostil, muito hostil. E aí não é só uma questão de conscientização, é uma questão também de adequar a infraestrutura, hoje ela é inapropriada, vamos ser sincero. Tem que ser guerreiro para andar de moto e de bicicleta.

George QueirozNoves fora o que o Hadad fez né? O que não foi pouca coisa né? Ele perdeu um mandato para, para vamos dizer, ele perdeu a sua popularidade para fazer uma coisa que é muito correta, todo mundo sabe que é correta dentro da literatura científica. Gastou muito pouco dinheiro, mas o preço político que se paga né? É um ônus político. Então quando a gente fala de carro, e subvenção a carro é um ônus, e aí fala bicicleta e é tratada como brinquedo entendeu? Esse que é um problema do debate de senso comum e eu acho que acaba passando por uma Reforma tributária.

Rodrigo Orair –  O imposto seletivo pode ser uma ponta de lança, de criar um sistema de financiamento dessas políticas. E aí, inclusive, tem que ter readequação de infraestrutura, tem que ter conscientização, tem que ter sim a subvenção. Se você está punindo as danosas ao meio ambiente, você tem que subvencionar aquelas que estão relacionadas com a preservação ambiental, que são ambientalmente corretas. Você tem que financiar também o desenvolvimento de tecnologias alternativas. Enfim, acho que a bicicleta pode entrar num sistema desses, de políticas ambientais, por que não né? Que pode ser catapultado a partir do novo imposto seletivo.

George Queiroz – Agora só uma questão. O imposto seletivo, vai ser debatido depois né? Lei complementar…

Rodrigo Orair – Esse é o ponto. O que que a gente tá fazendo agora? Mudando a Constituição e definindo as diretrizes. O desenho disso vai ser na legislação complementar. E aí vai ter que ouvir a sociedade e ver o que que ela está disposta a fazer. Isso é política. Obviamente tem grupos políticos que querem restringir o uso do seletivo e dos canais de financiamento que ele pode destinar recursos. Vai ser uma briga política, não posso também, não podemos sair leviano aqui e sair vendendo coisa. Mas eu acho que tá aberto esse debate. Vai ter essa janela de oportunidade na legislação complementar, a gente vai avançar nessa direção.

George Queiroz – Essa legislação, leva mais uns 2 anos? Quanto tempo esse debate deve acontecer?

Rodrigo Orair – Em 2024 e 2025 vão ser discutida as legislações complementares, incluindo a do Imposto Seletivo no Congresso. A partir 2027 começam as transições até 2032. É uma reforma muito diluída, porque ela traz muita mudança.

George Queiroz – Vão ter testes né?

Rodrigo Orair – Vai ter um ano de teste em 2026 aí a partir de 2027 a gente vai desmontando os tributos atuais, zerando o IPI; acaba o PIS/Cofins. Um pouquinho mais adiante vai desmontando o ICMS e o ISS, aí no final nós vamos ficar só com os dois impostos novos. O dual (CBS) que é o imposto Federal e o subnacional, o IVA moderno, e o imposto seletivo. O IVA moderno tem duas contrafaces são dois irmãos gêmeos na verdade, um Federal o outro estadual e municipal, chamado de subnacional. Do ponto de vista de quem está comprando a bicicleta é como se fosse um só. A diferença é que cada um tem uma alíquota e vai para cada um dos orçamentos (da União, do Estado e do Município), mas do ponto de vista de quem tá comprando bicicleta é um só. O

 imposto seletivo que não vai incidir sobre bicicleta, tá, que vai incidir sobre aquelas coisas danosas ao meio ambiente e a saúde e a tendência no final  dizer a partir de 2033 você tem vai ter aquele modelo parece como tem nos Estados Unidos na Europa que tem o valor e mais o o lá na Nota Fiscal ali o valor do Imposto eh discriminado ali na na notinha né ess Vale tá hoje não vale! tá hoje o cidadão hoje, hoje tem, mas não vale, para nada tá.

Hoje você chega lá na loja de bicicleta, você compra bicicleta, ou você entra na internet compra uma bicicleta, sai lá um valor de ICMS de PIS/Cofins que é fictício. Ele não reflete a quantidade de imposto que tem dentro da bicicleta porque hoje você tem toda a tributação na cadeia interna. Quem produz peça de bicicleta, que são os insumos da bicicleta, paga imposto e não recupera, passa para frente. Quem produz a bicicleta paga mais imposto, não recupera, passa pra frente. O atacadista da bicicleta paga imposto, não recupera, passa pra frente. O varejista da lojinha de bicicleta paga imposto, não recupera, e passa pra frente. Aí no final, aquele imposto que você tá pagando, na verdade, não conta toda a história que é essa da cadeia. Nesse tributo moderno você acaba com essa tributação na cadeia. E aí o imposto final é o que vale. Então ele vai vir: preço da bicicleta mil reais; imposto recolhido 250 reais. É o que tem de imposto ali dentro. Ele é transparente. Quanto desse 250? Uma parte é Federal, uma parte é estadual, uma parte é municipal. O cidadão vai saber quanto tá pagando.

George Queiroz  – Quando foi lançada a campanha da Aliança sobre a a questão do Imposto seletivo a gente viê nas redes sociais, como eu te disse a comunidade da bicicleta ela é muito diversa em termos de posicionamentos políticos, mas o que imediatamente apareceu foram as pessoas que são contra o governo Lula dizendo imediatamente ali embaixo: tá vendo! O Lula quer aumentar impostos. Faz o L, porque vai aumentar o teu imposto. Porque um mito de que os governos de esquerda são necessariamente perdulários com a questão de gastos públicos, que quebram o país e que para isso tem que ficar aumentando impostos. Isso é um discurso neoliberal que e é moeda corrente entre os liberais, ou seja, o governo Lula é um governo gastador perdulário. E por isso tem que ficar aumentando impostos como por exemplo, da bicicleta, da televisão e do teu ar-condicionado.

Rodrigo Orair – Essa reforma não tem objetivo de aumento de carga tributária. Ela coloca na Constituição (Federal) que ela vai manter a carga tributária atual. O que acontece hoje é que você tem uma disparidade muito grande de tributação e ela vai uniformizar bens industriais. Todos esses exemplos que você deu aí vão convergir para baixo. Bicicleta, ar-condicionado, televisão, serviços tendem a abaixar de preço sim. Na verdade tem dois efeitos: primeiro, está modernizando, uniformizando. Hoje eles pagam demais.  Telecomunicações, todos esses, tendem a reduzir. Já o (imposto) de consumo de serviços principalmente pelos mais ricos, tendem de aumentar. Mas não quer dizer que vai ter inflação. Calma lá um dos grandes objetivos dessa reforma é crescimento econômico, simplificação e aumento de produtividade. No longo prazo, a economia brasileira vai ficar mais produtiva, vai ter menos inflação e não mais tá com a mesma carga tributária. Na verdade, a reforma prevê a possibilidade de você reduzir a carga tributária sobre bens e serviços e aumentar a do Imposto de Renda, caso avance a agenda.

Não existe qualquer possibilidade de aumentar a carga tributária em função desta reforma. A gente simplificando a reforma vai colocar na Constituição que a carga tributária brasileira não será aumentada. Vai ser constitucionalizado de que o cidadão médio não pagará mais impostos pelo menos aí no consumo. Esse é o princípio de neutralidade. E queria explicar esse básico né? Ela tá dizendo, olha os novos impostos vão ser calibrados para repor a arrecadação dos atuais. Para repor a arrecadação dos atuais nós vamos substituir um sistema que é ineficiente, injusto, cheio de iniquidades, por um sistema mais eficiente, muito mais justo, porque elimina uma série de iniquidades que existem hoje. A diferenciação de alíquotas joga contra os pobres. Uniformizar é melhor para população. É pior para os mais ricos e melhor para os mais pobres. Ela (a uniformização dos impostos da reforma) tem um efeito distributivo que é importante também que não pode ser desconsiderado principalmente com o cashback. Vai substituir um sistema ruim, por um melhor, com menos injustiças, mas para arrecadar exatamente igual. Os impostos novos estão sendo calibrados para repor arrecadação dos atuais. Você vai acabar com o PIS/Cofins, com IPI, com ICMS, com ISS. Você vai colocar no lugar o IVA e o Imposto Seletivo que vão arrecadar a mesma coisa do que aqueles que foram substituídos. Esse é o princípio basilar.

 #jornalbicicleta

(Edição de Rogério Viduedo)

Acesse aqui o site da Câmara dos Deputados com a explicação da Reforma.

 


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